27.3.12

série de







  





mensagens escritas.




sala




Cada vez mais, os tempos atraiçoados fazem em mim o meu espaço cada vez mais meu. Esta terra, existir, neste espaço, nestas lâmpadas, cada vez mais meus. Caminho. Caminhos, eus. Os tempos, deixados, desleixados, abandonados. A almofada que foi, que já não é. Sei que existi nessa almofada, mas hoje, não sou eu. Não existo mais ali. Comigo, o que deixou de ser, o cessar abrupto dos dias e das coisas. Nas margens dos caminhos, pairam os porquês. Afasto-os com a mesma almofada. Que foi, que já não é. Eus nos cantos, nos tapetes, no regador. Dos frisos dos tectos, pendem os porquês. Afasto-os com as minhas pálpebras fechadas. Não olho, não vejo, não conheço. E o que oiço, nos líquidos destilados das garrafas, é um fantasma. Já não sou eu. Não lhe respondo. Tempo longo, atraiçoado e abandonado, preso na curva do caminho. Desse que não sei. Mas que no peso do tempo, parece meu.








"É engraçado constatar que os egoístas não sabem, nem querem, ficar sozinhos"









Será?
Serás?
Serei?
...E por aí fora?



26.3.12

esticar



O tempo é uma plasticina.

Denso, om cor, com cores, pardo. Pesado. Maleável. Moldável. E existe, sempre. Não desaparece. E, à vezes, distende-se. E é preciso deixá-lo distender. Esticar. Que se estique, que se torne muito grande, esperemos. Esperamos, enquanto percorremos lentamente toda essa massa de plasticina. Porque não há mais nada a fazer. Porque um dia, o tempo há-de ganhar outra forma qualquer.

Deixá-lo passar.



24.3.12

planeta calhau


Não sei de que planeta veio esta história. Sim, uma história.

Mal contada.

E no entanto, substituem-se os calhaus. Como um hábito. O passado quebra-se, apaga-se, desloca-se e deserda-se. (talvez haja algum problema de reconhecimento). Que fotografias são estas?

Esta é uma história mal contada.
Ainda por cima.

Calhau, calhau, atira-te. Não falhes.





"...throw it at your face so you can know how much it hurts..."
Não há memória deste discurso.


20.3.12

sylvia



Sobre  como lá chegou, de alguma forma, para morrer. Eu estava lá. Desta vez, estive. E peguei-lhe, e confortei-a. E vi que não havia nada a fazer, se não esperar, calmamente, junto. Tremia, respirava muito e profundamente. Um inspiração profunda, tentar agarrar uma última molécula de oxigénio. E parou.

E pensei-lhe, adeus, não estiveste só.




ser coisa





As coisas não são meras coisas.

Um sofá não é só um sofá; é um poiso, um porto, um aconchego.
A comida não é mera comida; é experiência, é pretexto, é viagem.
Uma almofada é sonho, vontade, boneco de peluche.
Um carro não é só meio de transporte; é o miradouro, guardador de segredos, caixa de música.

As coisas somos nós a fazê-las coisas.




amanhã



A Primavera está quase a chegar. 
Mas, e o Sol, quando chega? A luz despreocupada, os reflexos de satisfação, os dias de sorrisos compridos? Os abraços dos pores-do-sol? Os raios brilhantes de músicas? 


Tanto nevoeiro, tanta chuva, um Inverno interminável. 


15.3.12

acções






Não consigo fazer nada

não é o mesmo

que

Não há nada que consiga fazer.

(substituir pela acção que se quiser)




14.3.12

série de







leves papoilas num muro qualquer. 
Para não ter que escrever nada do que me esmaga de tanto peso.





espera





Há alturas (horas, dias, semanas?)
em que apetece ficar quietinho num canto, sentadinho, sem mexer em nada, para ver se o tempo (horas, dias, semanas?)
passa sem fazer grandes estragos.


Ou



eu sou um elefante, e o tempo, uma loja de porcelanas.




13.3.12




só para dizer,



há rascunhos acumulados por aqui.



Não sei bem que lhes faça.


10.3.12

série de








 cores no mercado.




9.3.12

never ever there




Nunca estás lá. Porque chegaste tarde, porque não tinhas como chegar. Porque andavas à deriva, porque o vento não estava de feição. Porque sim, porque te deixas ir, porque não te guias. E nunca lá estás.
Ficas fora. Perdes momentos, perdes os teus momentos, como se nunca tivessem existido. Num mar de nuvens cinzentas, como as semente voadoras do dente-de-leão. Deambulas, vagueias, flutuas ao sabor da corrente.
E não há conclusão, nem moral da história.

Não estiveste lá.



4.3.12

série de






debaixo da ponte.
Onde dormimos todos, algum dia.




regresso de partir


É sempre este o sentimento:

quem parte fica descansado. Quem fica, não descansa.
Que nunca se pode ter o luxo de não esperar nada, de estar e passar pelos dias, porque há sempre alguém, alguma coisa a descansar-nos. Há sempre qualquer coisa a mais. E tu não sabes o que isso é. Não sabes viver a vida da perspectiva do cansaço.  Da espera. Da vigília. Do outro.


Há sempre um outro que nos não-descansa.
E é bom. E apertado. E triste.